8. Quem sou eu?... (Adolescência!)

Narciso por Caravaggio (1571-1610)
São Lucas nos apresenta um pequeno e significativo retrato de Jesus adolescente, ao dizer que ele crescia em tamanho, sabedoria e graça... (Lc 2,52). Após os 12 anos de idade, o judeu toma consciência da sua identidade e se torna responsável pela sua religião e pelos seus atos. O menino passa a ser ‘Bar Mitzvá’, isto é "filho do mandamento", e é chamado na Sinagoga para ler a Torá.

Desse modo, o jovem judeu deve observar a Torá e peregrinar a Jerusalém, por ocasião de uma festa religiosa importante. No relato de Lucas vemos Jesus no Templo, partilhando as Escrituras com os mestres da Lei; encontrado pelos pais, mantém diálogo enigmático, com traços preocupantes:
- Por que fez isso conosco?... perguntam os pais.
- Por que me buscavam?... responde Jesus.

Esse relato é conhecido como O menino ‘perdido’ e achado no Templo... O menino Jesus não se ‘perdeu’ e, provavelmente, ‘escolheu’ ficar em Jerusalém. Talvez, seria melhor dizer que Jesus estava ‘se encontrando’ no Templo. Jesus, ao responder ao seu chamado vocacional e reafirmar a sua liberdade e independência, começa a reclamar seus direitos e deixa os pais, antes de sair definitivamente de sua casa. Crescer jamais é ‘perder-se’!

1. Adolescência e condição humana. Alguns têm problemas de imaginar Jesus adolescente e preferem idealizá-lo como menino ou adulto. Jesus ‘aborrescente’?... Quem sabe esse mal-estar tem a ver com a ‘sexualidade’, que está à flor da pele no adolescente. Jesus passou pela puberdade e pela adolescência e experimentou as mudanças físicas e emocionais próprias dessa idade.

Na adolescência brotam os desejos e os sonhos... É o tempo da fantasia e de sentir com intensidade os anseios do coração.

Nessa fase e em quase todas as culturas, os jovens passam por ‘rituais de transição’, ao serem introduzidos no modo de proceder próprio do seu grupo social, eclesial ou familiar. Adolescência’ é sinônimo de crescimento e amadurecimento, embora tenha a conotação negativa de imaturidade e irresponsabilidade.

No caminho para a maturidade forçosamente passamos por esta fase de transformação e de rebeldia. Este período é um dos mais dramáticos, pelas mudanças profundas no campo físico, emocional, cognoscitivo, psicológico e espiritual. A ‘teenager’ é como um segundo nascimento, uma nova forma de ser. Podemos sinalizar duas fases:

A puberdade (até os 15 ou 16 anos), é o tempo de transformações e de independência crescente em relação aos pais. Começam os ruidosos ‘NÃO!’ a toda sugestão dos mais próximos, pais ou professores, pois o jovem busca o seu espaço físico e emocional. Essa experiência de liberdade se concretiza nas mais diversas formas de confronto, rebeldia ou mesmo de clamor silencioso.

A adolescência. Começam as preferências e os primeiros gostos acadêmicos, profissionais ou vocacionais. Os filhos ‘abandonam a própria casa’ de muitas formas, antes de deixar um dia os próprios pais. É lei de vida! Aos poucos, cada um abre seu caminho ao vislumbrar novos horizontes, interesses e valores.

Que seria da vida humana sem esta imaginação e liberdade? Elas exercem um formidável poder e fascínio ao ampliar o campo de visão e do conhecimento. Não vivemos apenas de fatos, mas também de ‘sonhos’, fundamentais no desenvolvimento humano. A imaginação é fonte inesgotável de criatividade e energia relacional.

Na adolescência, a energia sexual se projeta em pessoas reais ou imaginárias, facilitando os relacionamentos. A ‘fantasia’ possibilita isso de um modo natural!

Quando crianças, a fantasia nos envolvia, por horas a fio, em brincadeiras ‘imaginativas’ intermináveis. Na adolescência, a mesma ‘imaginação’ nos envolve em relacionamentos afetivos encantadores e prolongados. A ‘fantasia’ é o modo intuitivo e misterioso de preparar-nos para o amor maduro.

A ‘imaginação’ tem características próprias no homem e na mulher. Nos homens o estímulo visual é importante para deslanchar a imaginação, por isso a aparência física é importante. Nas mulheres a ‘fantasia’ é mais relacional e romântica, valorizam mais o carinho e suas expressões afetivas.

Algumas pessoas se apresentam como agressivas e grosseiras, por causa das suas ‘fantasias’ negativas. Outras vivem retraídas e cheias de temor. A ‘fantasia’, pois, exerce um poder extraordinário nos humanos, e é perigosa quando sufoca ou agride.

Seja como for, a ‘imaginação’, com suas sensações e desejos, é expressão natural do crescimento físico e emocional e sua moralidade dependerá do modo como conscientemente lidamos com ela. Relacionamentos abusivos são sinais de doenças emocionais profundas.

A “fantasia” manifesta o modo criativo das pessoas se preparem para o amor. Lembremos que tudo é bom, mas nem sempre o é para todos!

2. Mudanças físicas e aparência pessoal. As mudanças hormonais, próprias desta etapa, podem começar tanto aos 10 anos como aos 16. Em alguns, a maturidade física se completa rapidamente; em outros, demora alguns anos, conforme fatores internos (genéticos) e externos (clima, alimentação...). E a resposta a essas mudanças também é diversa: uns se enchem de entusiasmo e orgulho; outros se angustiam e deprimem. Todos, porém, se preocupam quando se desenvolvem muito cedo ou tarde demais.

A adolescência é tempo de comparações físicas (peso, altura, tamanho, timbre de voz...) e emocionais (ficar, namorar...) com repercussões acadêmicas e emocionais facilmente observáveis no grau de felicidade/aborrecimento e de socialização/isolamento, etc.

Os jovens começam a se afastar dos pais, buscando seu espaço e identidade pessoal. Os sentimentos de pertença e o de independência acontecem simultaneamente. Os problemas se solucionam parcialmente com tempo ou quando se muda o tipo de dependência (social, familiar, grupal, etc.). A turma dos amigos/as surge poderosa e, para alguns, se torna até prioritária. O jovem começa a ter ‘suas coisas’ (roupa, quarto, TV, celular...), mas se responsabiliza muito pouco por elas. Por detrás dessa grande confusão encontra-se um manancial profundo de vida.

Começam a brotar também perguntas pelo sentido da vida diante dos acontecimentos encontrados. Quem sou?... Você gosta de mim?... Sou capaz de amar alguém?... Que vou fazer com a minha vida?.... Onde está Deus?... Que é o que eu quero?... são perguntas que nem sempre recebem respostas adequadas.

3. Novos relacionamentos. O desejo de manter laços de amor começou no nascimento e prossegue pela vida toda. Ao mamar, os olhos da criança se fixavam nos olhos da mãe. Depois, vieram as brincadeiras, surgiram as panelinhas e por fim vieram as grandes amizades, passando pelas rivalidades e as chantagens emocionais... Aprendemos a partilhar a vida e também os nossos segredos!

O narcisismo é normal nesta fase e os relacionamentos afetivos mantidos são ‘exploratórios’ e pouco duradouros. O que se sente, se expressa por ‘exterioridades’: abraços, beijos, carícias... Alguns começam a ter relações sexuais e isso pode trazer consequências sérias e desnecessárias. O mundo interior é pouco valorizado e só aos poucos ele vai aparecendo e ocupando espaços. Certamente, tudo isso é bem mais complicado para quem é atraído por pessoas do mesmo sexo, pois a cultura predominante heterossexual força a disfarçar ou dissimular pelo medo da rejeição social.

A adolescência é o tempo dos encontros e desencontros e de crescer, como o jovem Jesus de Nazaré, ‘em sabedoria e graça diante de Deus e dos outros’. Desse modo, um dia entramos quase sem perceber nos umbrais da vida adulta.

Uma pergunta: Que lembranças você guarda do seu tempo de adolescência e como as sente agora? 

Um comentário:

  1. Olhar para si e ver o outro. Olhar para o outro e ver a si. Regra de ouro. Somos humanos. O que acontece com você acontece com o outro, o que acontece com o outro acontece com você. É o olhar do observador... (Regina Carvalho)

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