Por quê você acredita?...
O ser humano é complexo e as suas realidades física,
psíquica e espiritual devem ser tomadas sempre em conta. Geralmente usamos das
ciências para o nosso proveito e conhecimento, mas facilmente deixamos as que
estudam o psiquismo de lado por pensar que não somos estudados.
Aproximemo-nos, pois, dela, para perceber
melhor o que somos e o que Deus faz em nós.
Você já imaginou que a sua crença ou
descrença tem algo a ver com as realidades profundas do inconsciente? Não só o nosso modo de viver, mas
também o de crer têm suas raízes nessas realidades desconhecidas, mas
condicionantes da nossa vida pessoal, social e religiosa. A tese que apresento
é que no decorrer da vida, cada um se situa espontaneamente numa
espiritualidade que tem a ver com uma dessas três instâncias do nosso psiquismo
interior profundo: Id, Ego ou Superego. Sabemos que eles
marcam compulsoriamente o comportamento humano, mas agora receamos que também o
assinalem religiosamente.
Por que alguém é carismático? Só porque “gosta” ou porque sua
estrutura psíquica, primitiva e inconsciente, se identifica com aquilo que esse
movimento realiza e valoriza? E aquele outro jovem de família tradicional e
religiosa que se identifica mais com aquele movimento fundamentalista de
direita?... Somos nós que escolhemos o tipo de espiritualidade ou são
os nossos condicionamentos internos e inconscientes que nos situam
instintivamente num tipo de vivência religiosa, reforçando de algum modo a
neurose subjacente à nossa personalidade? E tudo em nome de Deus,
‘bondoso’ (Id) ou ‘poderoso’ (Superego)!
Apresento, pois, as
possibilidades psíquicas do Id, do Ego e do Superego como um espelho para delas
tirar maior conhecimento e possíveis respostas para o próprio agir. Lembremos
que os reclamos e projeções do Id e do Superego são sempre
instintivos e inconscientes e os do Ego, conscientes, mas todos eles são
‘fortes e significativos’. Isso quer dizer que trazem conseqüências sérias para
a própria vida e também para a vida religiosa!
Mas, o que é o Id? A palavra é curta, mas sua realidade
é imensa e poderosa. "O Id é aquela parte do inconsciente
formada basicamente por instintos primitivos, impulsos e desejos que
exigem satisfação imediata..." dizia-me uma psicóloga. O Id é a estrutura primitiva da
personalidade básica e central do ser humano regida sempre pelo princípio
do prazer.
E o Superego? "Se o Id
é instinto puro, o Superego é severidade repressiva em nome da
razão. É o órgão de repressão do Id" disse-me também ela. Quando encontramos uma pessoa prepotente e
castradora dizemos que está dominada inconscientemente pelo seu Superego que
censura suas pulsões primitivas projetando-as nos outros. É a cultura
institucional da proibição e repressão; do NÃO pode e do NÃO deve, em nome de
qualquer coisa menos a do crescimento pessoal. Manifesta-se à consciência
indiretamente sob a forma de uma falsa moralidade ou um conjunto de interdições
e deveres aterrorizantes para as pessoas.
Conhece alguém que vive espontaneamente
numa dessas situações? Eu sim! Sujeitos aparentemente bons, mas fortemente
hedonistas (Id) ou fanáticos e extremistas (Superego)? As pessoas do Id serão tachadas
facilmente de superficiais, sensuais e inconstantes; as do Superego, de
autoritários, frios e pragmáticos.
E o Ego? O Ego é aquela parte do Id que foi modificada pela
influência direta do mundo externo, fazendo-se consciente. O Ego representa
a razão esclarecida e não ideologizada, o senso comum; nosso contato possível
com o mundo exterior, o jeito de ser e viver enfim, nossa vontade e
consciência. Sua função? Fazer a passagem dos acontecimentos primitivos e
criativos do Id para o mundo externo. O Ego é quem decide se
estes acontecimentos são possíveis e necessários para serem concretizados
O Ego, pressionado pelos desejos
insaciáveis do Id e a severidade repressiva do Superego, decide o que e como
concretizar, pois se se submete totalmente ao Id, torna-se imoral
e destrutivo; se ao Superego, neurótico e insuportável. O Ego está dividido
entre o princípio do prazer (não conhece limites!) e o da obrigação (impõe leis
desumanas!). Conviver com essas realidades é criar mecanismos de defesa
(sublimação, repressão, projeção, isolamento, etc.) para sobreviver. Nas
pessoas normais o Ego torna fato aquilo que é possível; nos neuróticos e
psicóticos o Ego sucumbe, seja porque o Id ou o Superego são demasiadamente
fortes, seja porque o Ego é excessivamente fraco.
E você, onde se encontra nesse confronto?
O texto é esclarecedor, Pe. Ramón. Evidencia que também nossa espiritualidade funda-se nesses elementos constitutivos de nossa personalidade.
ResponderExcluirA conclusão mais imediata que tiro é que não podemos, como muitas vezes sou propenso a fazer, a julgar os outros por exibirem uma espiritualidade distinta da minha e com a qual não compartilho. O que leva uma pessoa a se afeiçoar a determinada espiritualidade tem raízes muito mais profundas e involuntárias do que costumamos pensar. Assim como essa minha "necessidade" de julgar os outros e de medi-los a partir de meus critérios.
A misericórdia e a ternura são, como sempre, chaves de leitura essenciais. Para os outros e para mim mesmo.