Inácio
de Loyola chegou a Jerusalém no ano de 1523.
Lembremos o acontecido... Deus entrou na vida de Ínhigo
muito mais do que aquela bala que o derrubou nos muros de Pamplona (20/MAI/1521). Se a bala
quebrou-lhe as pernas, Deus foi bem mais fundo, e atingiu sua alma.
Há datas inesquecíveis pelo significado que elas carregam.
Inácio de Loyola foi ferido gravemente na perna direita defendendo o castelo
de Pamplona. Os primeiros curativos vieram de seus próprios adversários. Carne
ferida, orgulho derrubado, auto-imagem destruída... Aceitando a mão estendida
do inimigo percebeu que muitas vezes a vida depende da boa vontade dos
outros...
Colocado numa maca foi levado, por vales e colinas, para a sua casa em Loyola, onde chegou derrubado e carregado, coberto de febre e vergonha. No dia
24/JUN, festa de S. João Batista, foi aconselhado a receber o sacramento da unção dos doentes,
pois seus estado de saúde se deteriorava rapidamente. E, quando todos esperavam o pior, inesperadamente, no meio da noite,
melhora. Era o dia de são Pedro, 29/JUN.
Passaram-se sete meses de convalescênça, tempo de questionamentos
intermináveis, perguntas e respostas naquela casa-Torre de Loyola. A leitura de livros piedosos foi o meio escolhido por Deus para entrar no coração deste
homem mundano. Nesse tempo, Inácio percebeu dois
toques internos importantes:
a) Um desejo profundo e verdadeiro de imitar Jesus e os santos.
b) E o desejo de
peregrinar a Jerusalém, terra de Jesus, como peregrino.
Se estes pensamentos eram de Deus deveriam ser concretizados. Assim, pois, decidiu por-se a caminho e peregrinar
sozinho a Jerusalém.
Jerusalém surgiu como o objetivo de uma peregrinação exterior e
visível. O caminho “exterior” que realiza é sinal de um outro caminhar
“interior”, muito mais difícil e significativo.
Caminho é fundamental para quem
deseja chegar a algum lugar. Se queremos subir
uma escada é preciso galgar os primeiros degraus. Inácio é um peregrino, não um vagabundo! O vagabundo caminha em ziguezague,
sem saber aonde vai.
O caçula de treze irmãos, deixa a casa paterna, 1522, e se coloca nessa
corrente infinda de homens e mulheres levados por Deus. Na pequena ermida de
Nossa Senhora de Aranzazú, faz voto de
castidade. E, na abadia beneditina de Monserrat ele confessa, arrependido, seus pecados, deixa suas armas (espada, punhal) colocando-as sobre o altar, e troca suas roupas boas e vistosas (símbolo
da fama e poder) com as de um mendigo... Livre e gozoso, Inácio parte para as
vizinhas grutas de Manresa, onde
fará, sem o saber, Exercícios Espirituais. Nessa experiência ficará por quase
10 meses, auto examinando, e rezando... O pensamento de “ir para Jerusalém” continua teimosamente presente.
Não foi fácil concretizar o
seu desejo: Na bela e rica República de Veneza dorme sob os pórticos da praça de São Marcos com os pobres. Naquele
ano, por causa da queda de Rodas nas mãos dos Turcos, apenas 21 peregrinos
tiveram coragem de partir para Terra Santa. Solimão I, o Magnífico (1520-1566)
apoderou-se de Jerusalém, destruindo, mais uma vez os vestígios mais
expressivos do cristianismo. Inácio não
arredou pé e continuou seu caminho.
A nave principal, a “Peregrina”
saiu de Veneza no dia 29 de Junho de 1523; a de Inácio, a “Negrona”, quinze dias depois (14 de Julho) com apenas 8 peregrinos.
Um mês depois, chegaram a Chipre.
No projeto inicial, a “Negrona” deveria desembarcar os passageiros em
Beirute e, desse modo entrariam pelo norte, isto é pela Galiléia na Terra Santa.
Não foi assim! O comandante do barco sabendo que a peste chegara à Síria, não
quis continuar caminho. Inácio, apesar desses contratempos, embarcou numa outra
pequena nave, rumo a Jaffa.
Quando a nave chegou a Jaffa,
era pleno verão (25/AGO). Apesar disso, obrigaram os peregrinos a ficarem no
navio por mais uma semana, à espera do capitão que fora a Jerusalém notificar a
chegada às autoridades turcas e ao Pe. franciscano, Guardião da Terra Santa.
Por fim, com a chegada de cem soldados turcos e de dois frades
franciscanos, os peregrinos tomam o caminho de Jerusalém (63 Km). O frade
franciscano (de origem holandesa) deu as recomendações e avisos de praxe no
próprio navio, falando em alemão, italiano e latim. Inácio, que não entendia nenhuma dessas línguas, foi
ajudado por um padre espanhol que ia no grupo. Era a festa de Santa Ana de
Jerusalém (1/SET), daquela idosa que enxergou no menino Jesus mais do que via. Passaram
por Ramla (43 km de Jerusalém), lugar de José de Arimateia,
discípulo de Jesus. Encontraram-na destruída pela passagem violenta dos
guerreiros do sultão. Depois, passaram pela bíblica Quiryat
Ye`arim
(cidade dos bosques), atual
Abou-Gosh,
(18 km de Jerusalém), onde a Arca da Aliança ficou por quase 50 anos na casa de
Abinadab, até o rei Davi a levar solenemente a Jerusalém e, por fim Nabi Samuil.
Na entrada de Jerusalém, a santa Cruz ía na frente, empunhada por um
dos frades, abrindo caminho... O clima é
de intensa espiritualidade e emoção. Inácio extasiado “vê” as pessoas que
encontra (tanta diversidade de raças e culturas!); “ouve” o que falam (sem nada
entender!) e entra nesta simbólica cidade como se mergulhasse numa fonte de
vida e luz. Quando velho em Roma, recordará este momento como “de grande consolação e devoção”.
Era o dia 4/SET, comemoração de São Moisés, quando entraram pelas
portas destruídas de Jerusalém, e lá ficará até o dia 23. Apenas 19 dias! Eis os
lugares visitados por Inácio:
Dia 5/SET (sábado): missa de manhãzinha no Cenáculo[1], lugar da última ceia de Jesus.
Descendo para o piso térreo, bem embaixo de onde celebraram, visita a tumba do
santo rei Davi; mais para a esquerda e bem pertinho do Cenáculo (apenas uns 10
m.) vê as ruínas da igreja Santa-Sião, lugar da “Dormição” de Nossa Senhora. Pela tarde, vai à igreja do Santo Sepulcro de Jesus, onde passa a
noite em oração diante do Calvário.
Dia 6/SET (Domingo): De manhãzinha, missa no Santo
Sepulcro[2].
Pela tarde, ás 15h., faz a Via Sacra,
percorrendo os diversos passos da Via Dolorosa, no meio dos barulhentos árabes,
sempre tão distantes e estranhos.
No dia 7 (segunda-feira): novamente missa no Cenáculo.
Aqui, neste pequeno lugar, séculos atrás, aconteceram fatos extraordinários. Depois,
junto com os outros peregrinos, atravessam a cidade velha, passam perto do túmulo de Absalão (filho amado do rei Davi!) e do apóstolo Tiago; descem ao torrente Cedron (nesta época do ano
seco e fedorento!) e entram no jardim de Getsemani,
lugar onde Jesus tremeu até suar sangue... Depois de rezar e beijar as pedras
que testemunharam tamanho sofrimento, Inácio sobe o íngreme monte das
Oliveiras, a caminho de Betânia (distante
apenas 2,7 Km de Jerusalém). Visita a casa
de Simão, o leproso e entra na escura tumba
de Lázaro....
Volta por Betfagé
(“casa do figo”) e, no cume do Monte
das Oliveiras, visita as ruínas da basílica
in “Eleona[3]”,
onde reza junto com seus companheiros, o Pai-Nosso na gruta que ali se
encontra. A uns metros, um pouco mais no alto, visita emocionado a pequena capelinha da Ascensão, propriedade de
uma família muçulmana, onde “está uma
pedra, da qual subiu o Senhor aos céus e na qual se veem, ainda agora, suas
pegadas impressas... Lá orou com intensa consolação”. Ao entardecer, desce pelo lado onde se
encontra hoje a capela do “Dominus
Flevit”, passa pelos desordenados túmulos muçulmanos, e chega, de novo, ao
vale do Cedron. Entra na gruta da Agonia
e a uns dez metros visita o santo
sepulcro de Nossa Senhora. Dia intenso de emoção e devoção!
Dia 8/SET (Terça-feira): os peregrinos alugam jumentos para percorrer, sob intenso sol e calor
das imediações do deserto de Judá, os 9
km que os separam da bendita Belém. Antes
da chegada, visitam a tumba de Raquel,
esposa amada de Jacó. Depois, entram piedosamente pela pequena porta (pouco
mais de 1,50 m de altura) na basílica da
Natividade[4]...
Visitam, também a Igreja de Santa Catarina e entram na Gruta de S. Jerônimo[5],
e passam a noite em oração, junto da gruta do nascimento de Jesus.
Dia 9/SET (Quarta-feira): de manhãzinha, Missa na gruta
do Nascimento. Depois, retomam o caminho, passando pelo vale de Refaim e chegam
a Ein-Karem, lugar do encontro de
Nossa Senhora com sua prima Isabel. Antes de entrar na Igreja da "Visitação" bebem água da fonte da
Virgem Maria. Também entra na gruta do nascimento de João, o Batista...
Dia 10/SET (Quinta-feira): vai ao Campo do Hacéldama
(onde Judas se enforcou) e, a seguir, entra no antigo jardim dos reis, desce as
escadas da piscina de Siloé[6],
onde molha o rosto e os olhos; volta
pelo vale do Cedron e visita o túmulo de
Nossa Senhora.
Dia 11/SET (Sexta-feira): entra na explanada do Templo
e visita a Gruta de Davi dentro da Mesquita de Omar; voltando, passa a
noite em oração, junto ao Santo
Sepulcro.
Dia 12 e 13 (sábado e
domingo): não sabemos o que ele fez nesse fim de semana.
Dia 14 (Segunda-feira): vai num jumento a Jericó,
percorrendo 30 Km do deserto de
Judá. O calor é intenso. No meio do caminho descem dos jumentos para ver, à
distância, o pequeno mosteiro ortodoxo de são Jorge “in Koziba”, pendurado nas
rochas. Em Jericó, visita a Casa de
Zaqueu[7].
Dia 15 (Terça-feira): todos vão até o rio Jordão,
ao lugar onde Jesus foi batizado. Alguns mergulham na água, e todos saciam sua
sede... Voltando a Jericó, visitam a fonte
de Eliseu. No horizonte, ele vê o monte
da Quarentena ou das tentações...
Dias 16 a 20 (Quarta-feira até
Domingo): não podem sair do pequeno mosteiro do Monte Sião, por
causa da chegada de 400 soldados turcos que colocam em risco a vida dos
peregrinos cristãos.
Dia 21 (Segunda-feira): volta ao Santo Sepulcro,
onde passa a noite em oração.
No dia 22/SET (Terça-feira): passa a manhã no Santo Sepulcro.
Três dos peregrinos são feitos cavalheiros do Santo Sepulcro. Inácio conta o
que também fez nesse dia: “Fui sozinho ao
Monte das Oliveiras (para ver de
novo a capelinha da Ascensão!). Mas, como
os guardas não me deixaram entrar, dei-lhes um canivete... Veio-me o desejo de
ir a Betfagé... Estando lá, lembrei-me de não ter fixado bem de que parte
estava o pé direito e de quer parte o pé esquerdo de Jesus (na pedra da
Ascensão!). Voltei e tive que dar umas
tesourinhas aos guardas para que me deixassem entrar[8]”.
Dia 23/SET (Quarta-feira): Alguns vão novamente a Getsêmani
e ao túmulo de Nossa Senhora, entre eles Inácio. Às 22h, no meio da
escuridão, todos deixam por última vez Jerusalém, montados em jumentos. Passam
novamente pelas ruínas de Ramla, até chegar a Jaffa. Embarcam, de volta para
Veneza, no dia 3 de Outubro. Não puderam visitar a Samaria, nem a Galileia, por
causa de Solimão I[9].
Inácio não queria voltar. Seu pensamento “melhor” apontara para esta terra e ali decidira ficar.
Falou com o Pe. Guardião dos franciscanos, manifestando-lhe o seu desejo, mas ele não o permitiu...
Teremos uma peregrinação Nos passos de Santo Inácio de Loyola para 3 a 20/SET/2016.
Maiores informações com a ITIQUIRA Turismo (Fone: 61 3226 8980; E-mail: internacional@itiquiraturismo.com.br)
[1]Inácio e os
peregrinos ficaram hospedados no Convento dos franciscanos que aqui havia desde
1333. Uma curiosidade: este grupo de peregrinos foi o último a celebrar a
Eucaristia no Cenáculo. Os muçulmanos tomaram o lugar dos franciscanos em 1524,
impedindo de celebrar a Eucaristia nesse local, até os dias de hoje. Após a
guerra dos 6 dias (1967) o local pertence atualmente ao governo de Israel.
[2]A capela
que temos hoje é de 1810 e se encontra dentro da grande basílica
constantiniana; a anterior sofreu um incêndio em 1808.
[3] “In Eleona”, isto é, nas oliveiras. Esta é uma das três basílicas
construídas por santa Helena, no tempo de Constantino. As outras são a do Santo
Sepulcro e a da Natividade, em Belém.
[4] A Basílica da Natividade é
antiquíssima. O primeiro edifício é constantiniano (a. 326); dele restam apenas
alguns mosaicos no piso. O edifício atual é fundamentalmente do tempo de
Justiniano (a. 540). Aqui nasceu Jesus, da Virgem Maria!
[5] São Jerônimo, aos 46 anos de
idade, viajou para Belém (ano 386) com as damas Santa Paula e a filha desta,
santa Eustóquio (sic!). Em Belém, Jerônimo traduziu a Bíblia do hebraico para o
latim, texto chamado hoje de “Vulgata”. Jerônimo ao morrer (a. 420) foi
sepultado numa gruta, próxima daquela da Natividade.
[6] Construída por Ezequias (700 aC)
com água vinda da fonte Kihon, através de um canal longo 550 m. Aqui Jesus curou o cego de nascença.
[8] Autobiografia, #47.
[9]O sultão
Solimão fez os atuais muros de Jerusalém (s. XVI) poucos anos depois da visita
deste grupo de peregrinos.
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