Pe. J. Ramon e eu na praça Sultanahmet, e momento da
explosão fotografado por um turista...
Como é que isso não aconteceu antes? Essa
foi a pergunta que me fiz após ver a notícia sobre o ataque terrorista ocorrido
em Istambul dias atrás. Tendo a concordar com os
especialistas quando dizem que, se uma pessoa sente que as regras de segurança
são muito rigorosas, é sinal de que elas estão funcionando. Se uma pessoa quase
não percebe as normas, é por que elas provavelmente funcionam ainda melhor.
O problema é quando nos
sentimos desconfiados, sem acreditarmos que os tais “procedimentos de segurança” realmente estão funcionando. Onde um cidadão comum sente desconfiança,
um criminoso enxerga uma oportunidade, uma brecha.
Tive a oportunidade de presenciar como eram as regras
para se entrar nos EUA antes de 2001, e também após o 11/SET daquele ano.
Amigos norte-americanos diziam-me que abriam mão de alguns minutos de
comodidade em prol do coletivo, da segurança que todos gozavam com as rotinas
de revista e checagem das autoridades. O
fato das revistas terem se tornado mais rigorosas dava a todos a sensação
(ainda que meramente psicológica) de
segurança. O pragmatismo americano de que “a eterna vigilância é o preço da liberdade” não poderia ter sido
concretizado em melhor forma.
Outra lembrança que me ocorre foi quando Renata e eu
voamos pela El Al, companhia aérea israelense. Um prato cheio para qualquer
desequilibrado que quisesse repetir Munique em 1972. Pois bem, o voo inteiro
foi separado em uma ala vazia do aeroporto e, antes do check-in, várias filas
foram formadas. Encabeçando cada uma delas, um israelense a fazer inúmeras
perguntas: quem é você, qual é sua
profissão, motivo da viagem a Israel, conhece alguém lá, vai se encontrar com
alguém, dentre outras. Detalhe: em nenhum momento se é informado se aquele
que interroga é funcionário da companhia aérea, membro da tripulação, policial
ou agente do Mossad. Alguns talvez sejam
tudo isso. Além disso, assim que comecei a responder às perguntas, uma
funcionária dirigiu-se até a Renata e, em separado, começou a “entrevista” com
ela. Quando nós dois terminamos, os dois funcionários pediram que aguardássemos
e foram fazer o “double check”: confrontar as respostas que havíamos dado. Eles
já sabiam que éramos esposos e tinham ciência de nossos itinerários passados e
futuros, antes de todo o processo. Aliás, processo
esse que foi demorado, mas muito respeitoso e agradável. Após as
informações de praxe, assuntos diversos foram pauta da minha conversa com o
agente, que falava português e inglês perfeitamente. Resultado: Renata e eu sentimo-nos seguros e conseguíamos perceber
o mesmo no semblante de todos os outros passageiros.
Entretanto, Renata
e eu tivemos um percalço certa vez, em outro local. Estávamos com um grupo,
atravessando o posto de imigração, quando nossos passaportes foram retidos. O
funcionário da imigração parecia confuso por detrás da grossa camada de vidro e
só dizia que havia um problema e que não poderíamos prosseguir. Ele pegou um
telefone e começou a falar em uma língua muito diferente de qualquer outra
coisa para que arriscássemos interpretar. Ele apanhou nossos passaportes e
marcou-os com um carimbo vermelho. “Mau
sinal”, pensamos ao nos entreolharmos. Pedimos mais informações, mas o
atendente da imigração falava um inglês macarrônico (!!!) e apenas gesticulou
em direção a outro guichê, mais afastado. Começamos
a ficar preocupados, pois nosso voo sairia em pouco tempo. Pedimos
informações a vários funcionários que, aparentemente, não falavam inglês.
Voltei ao guichê anterior e quase fui contido por seguranças, mas tive tempo de
explicar ao funcionário da imigração que nosso voo iria partir e não sabíamos
por que estávamos detidos ali. Ele, com mais alguns gestos, pediu para que eu
voltasse ao local em que estava e colocou o telefone no ouvido. Voltei e ele
ligou para o funcionário do guichê isolado, onde Renata e eu já nos
encontrávamos. Após alguns minutos, já
de posse de nossos passaportes, o funcionário desligou o telefone, bateu
outro carimbo e disse que deveríamos passar pela imigração… através da fila de embarque diplomático.
Embora estivéssemos loucos para sair dali, Renata e eu não fazíamos parte de
nenhum corpo diplomático. Questionamos, mas o atendente disse que era aquele
caminho mesmo. A fila de homens engravatados passou a fitar aquele casal de
turistas com trajes esportivos e mochilas nas costas, mas seguiu seu curso. O
funcionário da esteira e da revista nos saudou com um inglês muito melhor do
que aquele da imigração e nos desejou uma boa viagem.
Renata e eu saímos e conseguimos, após uma breve
corrida, apanhar nosso voo. Contudo, até hoje não sabemos o que foi que
aconteceu, o que nos deixou com uma péssima impressão sobre a organização e a
pretensa estrutura de segurança. E toda
essa epopeia ocorreu no aeroporto Ataturk em… Istambul. Portanto, por mais
que pesem as questões geopolíticas e, principalmente, a ambiguidade da relação
turca com o Daesh (Estado Islâmico), não foi com surpresa que questionei-me ao
saber da explosão do homem-bomba na
praça Sultahnamet: “Como é que isso
não aconteceu antes?”
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