Quero ver o direito brotar como fonte
e correr a justiça qual riacho que não seca... (Am5,24)
Neste ano de
eleições municipais, a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB dirige ao povo
brasileiro uma mensagem de esperança,
ânimo e coragem. Os cristãos católicos, de maneira especial, são chamados a
dar a razão de sua esperança (cf. 1Pd 3,15) nesse tempo de profunda crise pela qual passa o Brasil.
Sonhamos e nos
comprometemos com um país próspero, democrático, sem corrupção, socialmente
igualitário, economicamente justo, ecologicamente sustentável, sem violência,
discriminação e mentiras; e com oportunidades iguais para todos. Só com
participação cidadã de todos os brasileiros e brasileiras é possível a
realização desse sonho. Esta participação democrática começa no município onde
cada pessoa mora e constrói sua rede de relações. Se quisermos transformar o Brasil, comecemos por transformar os
municípios. As eleições são um dos caminhos para atingirmos essa meta.
A política, do ponto de vista ético, “é o conjunto de ações pelas quais
os homens buscam uma forma de convivência entre indivíduos, grupos, nações que
ofereçam condições para a realização do bem comum”. Já do ponto de vista da
organização, a política é o exercício do poder e o esforço por conquistá-lo1,
a fim de que seja exercido na perspectiva do serviço.
Os cristãos leigos
e leigas não podem “abdicar da participação na política” (Christifideles
Laici, 42). A eles cabe, de maneira singular, a exigência do Evangelho de construir o bem comum na perspectiva do
Reino de Deus. Contribui para isso a participação consciente no processo
eleitoral, escolhendo e votando em
candidatos honestos e competentes. Associando fé e vida, a cidadania não se
esgota no direito-dever de votar, mas se dá também no acompanhamento do mandato
dos eleitos.
As eleições municipais têm uma atração e uma força próprias pela
proximidade dos candidatos com os eleitores. Se, por um lado, isso desperta
mais interesse e facilita as relações, por outro, pode levar a práticas condenáveis como a compra e venda
de votos, a divisão de famílias e da comunidade. Na política, é fundamental
respeitar as diferenças e não fazer
delas motivo para inimizades ou animosidades que desemboquem em violência
de qualquer ordem.
Para escolher e votar bem é imprescindível conhecer, além dos programas
dos partidos, os candidatos e sua proposta de trabalho, sabendo distinguir
claramente as funções para as quais se candidatam. Dos prefeitos, no poder executivo, espera-se “conduta ética nas ações públicas, nos contratos assinados,
nas relações com os demais agentes políticos e com os poderes econômicos”2.
Dos legisladores, os vereadores,
requer-se “uma ação correta de fiscalização e legislação que não passe por
uma simples presença na bancada de sustentação ou de oposição ao executivo”3.
É fundamental
considerar o passado do candidato, sua conduta moral e ética e, se já exerce
algum cargo político, conhecer sua atuação na apresentação e votação de
matérias e leis a favor do bem comum. A
Lei da Ficha Limpa há de ser, neste caso, o instrumento iluminador do eleitor
para barrar candidatos de ficha suja.
Uma boa maneira de conhecer os candidatos e suas propostas é promover debates com os concorrentes.
Em muitos casos cabe propor lhes a
assinatura de cartas-compromisso em relação a alguma causa relevante para a
comunidade como, por exemplo, a defesa
do direito de crianças e adolescentes. Pode ser inovador e eficaz elaborar
projetos de lei, com a ajuda de assessores, e solicitar a adesão de candidatos
no sentido de aprovar os projetos de lei tanto para o executivo quanto para o
legislativo.
É preciso estar
atento aos custos das campanhas. O gasto exorbitante, além de
afrontar os mais pobres, contradiz o compromisso com a sobriedade e a
simplicidade que deveria ser assumido por candidatos e partidos. Cabe aos
eleitores observar as fontes de arrecadação dos candidatos, bem como sua
prestação de contas. A lei que proíbe o
financiamento de campanha por empresas, aplicada pela primeira vez nessas
eleições, é um dos passos que permitem devolver ao povo o protagonismo
eleitoral, submetido antes ao poder econômico. Além disso, estanca uma das
veias mais eficazes de corrupção, como atestam os escândalos noticiados pela
imprensa. Da mesma forma, é preciso combater
sistematicamente a vergonhosa prática de “Caixa 2”, tão comum nas campanhas
eleitorais.
A compra e venda de
votos e o uso da máquina administrativa nas campanhas constituem crime
eleitoral que atenta contra a honra do eleitor e contra a cidadania. Exortamos os
eleitores a fiscalizarem os candidatos e, constatando esse ato de corrupção, a
denunciarem os envolvidos ao Ministério Público e à Justiça Eleitoral, conforme
prevê a Lei 9840, uma conquista da mobilização popular há quase duas décadas.
A Igreja Católica
não assume nenhuma candidatura, mas incentiva os cristãos leigos e
leigas, que têm vocação para a militância político-partidária, a se lançarem
candidatos. No discernimento dos melhores candidatos, tenha-se em conta seu
compromisso com a vida, com a justiça, com a ética, com a transparência, com o
fim da corrupção, além de seu testemunho na comunidade de fé. Promova-se a renovação de candidaturas, pondo fim ao
carreirismo político. Por isso, exortamos as comunidades a aprofundarem seu
conhecimento sobre a vida política de seu município e do país, fazendo sempre a
opção por aqueles que se proponham a governar a partir dos pobres, não se
rendendo à lógica da economia de mercado cujo centro é o lucro e não a
pessoa.
Após as eleições, é importante a
comunidade se organizar para acompanhar os mandatos dos eleitos. Os
cristãos leigos e leigas, inspirados na fé que vem do Evangelho, devem se
preparar para assumir, de acordo com sua vocação, competência e capacitação, serviços nos Conselhos de participação
popular, como o da Educação, Saúde, Criança e Adolescente, Juventude,
Assistência Social etc. Devem, igualmente, acompanhar as reuniões das
Câmaras Municipais onde se votam projetos e leis para o município. Estejam
atentos à elaboração e implementação de
políticas públicas que atendam especialmente às populações mais vulneráveis
como crianças, jovens, idosos, migrantes, indígenas, quilombolas e os pobres.
Confiamos que nossas comunidades saberão se organizar para tornar as
eleições municipais ocasião de fortalecimento da democracia que deve ser cada
vez mais participativa. Nosso horizonte seja sempre a construção do bem comum.
Que Nossa Senhora
Aparecida, Mãe e Padroeira dos brasileiros, nos acompanhe e auxilie no
exercício de nossa cidadania a favor do Brasil e de nossos municípios, onde
começa a democracia.
Aparecida - SP, 13 de abril de 2016
Dom Sergio da Rocha
Arcebispo de Brasília
Presidente da
CNBB
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Dom Murilo
Sebastião Ramos Krieger, SCJ
Arcebispo São Salvador da Bahia
Vice-Presidente da CNBB
|
Dom Leonardo Ulrich Steiner
Bispo Auxiliar de Brasília
Secretário-Geral da CNBB
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