No cotidiano,
deparamo-nos, frequentemente, com pessoas em situações degradantes. Nessas horas,
sobrevêm-nos o sentimento de indignação e a pergunta: Porque alguém se submete à humilhação?
Assusta a quantidade de pessoas que se encontram em relacionamentos
abusivos, em que um dos envolvidos é subjugado
e agredido, seja verbal, moral, psíquica ou fisicamente. E quando falamos
de relacionamentos, não dizemos apenas da experiência de casal. Relações profissionais, de amizade,
religiosas etc. também podem se pautar no abuso.
Porquê alguém
permanece numa relação que a degrada? A pergunta visa entender os mecanismos de aprisionamento, o processo de
empoderamento e o romper com sua condição de vítima.
1. As formas mais
intensas de humilhação não são impostas de uma vez. Elas começam
pequenas e vão crescendo paulatinamente. Existe certa didática na opressão que
“ensina” ao outro o lugar inferior da relação. Tudo começa com o olhar do predador. Ao se deparar com as carências
do outro, aproxima-se como aquele que irá supri-las. O campo a ser explorado é
o de suas feridas, faltas, traumas, insucessos, mas não só. O caçador se camufla com os desejos e
sonhos da vítima, atrai com o odor da esperança, e veste-se com a visão de um
futuro melhor.
2. O segundo passo é explorar mais a fundo
a fragilidade de modo que se gere dependência. É evidenciar
defeitos – reais ou não, porque alguns são inventados para que se gere
vulnerabilidade – e se colocar como aquele que pode suportá-los; talvez o
único. “Você não é tão bom profissional,
mas acredito que pode melhorar e por isso não vou lhe demitir”; “Você precisa cuidar melhor do seu corpo, mas
eu te amo mesmo assim”; “Você precisa
aprender o modo de agir de nossa instituição (Igreja, congregação
religiosa, instituição de trabalho voluntário etc.) para realizar o imperativo do seu coração (vontade de Deus,
vocação, ideal)...” São as falas dos
opressores.
3. O terceiro passo consiste nas “sugestões”
de melhora. Tendo fragilizado seu alvo, começam
a imposição de normas e deveres. As regras são impostas na figura de
liberdade: “Você está nessa relação
porque quer... Caso contrário, tudo se acabará e a opção terá sido sua. Você é
livre para ir embora, mas se for do jeito que está, você será infeliz. Estou aqui
para te ajudar...”. O terceiro passo
já vem acompanhado pelo quarto, a ameaça. E assim vai se conjugando
fragilização com pequenas compensações como um elogio, um afago, um presente, o
que vai ficando cada vez mais raro à medida que as exigências vão crescendo.
As ordens se tornam mais imperativas e começam a surgir punições, e o
respeito se acabando, ao ponto de se chegar à ofensa explícita ou mesmo
agressões físicas. Nas primeiras vezes
acompanha-se de um pedido de desculpa: “Olha
o que você me fez fazer!”. Quando se
chega a esse ponto, o processo já está concluído.
Uma das soluções está em mostrar outros
mundos e possibilidades, afirmar a
positividade da vítima, seus valores e dignidade. Por isso os abusadores
não gostam que seus oprimidos se relacionem com outros. Se a vítima descobrir o quanto é digna, valorosa, bela, inteligente
etc., perceberá que não precisa se submeter a uma meia-vida. Empoderar não
é dar poder, mas ajudar a reconhecer o poder que já se tem. A culpa nunca é da
vítima. Comece elogiando um fragilizado,
pois se a entrada da escravidão foi aí, também pode ser o início de sua
libertação.
Uma pergunta: O que achou desse tema?
Querido Amigo jesuíta,Pe.Ramon Cigõna,SJ
ResponderExcluirEsse texto do senhor tocou lá no fundo do meu Ser!!!
Ao ler,senti Deus me falando....
Sei muito!!!bem o que é isso e por isso,corajosamente!!!!escrevo aqui e agradeço-lhe.
Um abraço.
Ceres de Andrade Paes.
Profundo e interessantíssimo. Obrigada.
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