“Pode acontecer que, arrancando o joio,
arranqueis também o trigo...” (Mt 13,29-30)
A Bíblia fala sempre da vida humana, e nela encontramos
inúmeras referências à questão da sombra ou do lado obscuro em nossa
vida. As parábolas de Jesus desvelam o que somos, e o que acontece
em nosso interior. Todos os personagens
que aparecem nos pertencem. As parábolas são tremendamente iluminadoras.
A realidade da vida humana sempre mescla
o bem e o mal, o trigo e o joio, a boa e a má erva. Todos gostaríamos que as coisas fossem de outra maneira, mas em nosso
interior sentimos cruamente o trigo e joio, quando gostaríamos ser um bom campo
de trigo, antecipando um pão abundante.
A
parábola do joio e do trigo revela a
tendência humana em realizar os ideais de perfeição
e distanciar-se cada vez mais de sua condição de criatura. O ideal de ser “puro”
e “justo”,
sem imperfeição ou fraqueza. Isso nos levaria ao rigorismo e à violência contra
nossas próprias limitações.
Aquele que, a qualquer preço, deseja ser
“perfeito”,
em seu campo não irá crescer senão um trigo raquítico. Nas nossas raízes o joio está intimamente misturado com o trigo.
Quando alguém não admite em si nenhuma falha, com suas paixões ele arranca
também a própria vitalidade, com a
fraqueza ele destrói também a própria força. Muitos perfeccionistas e
idealistas se fixam de tal maneira sobre o joio em seu interior que só pensam
em eliminar as falhas, de tal modo que a vida mesma fica prejudicada. De tão perfeitos,
eles ficam sem força, sem paixão, sem coração.
Uma
espiritualidade “perfeccionista” leva a um rigorismo moral, contra o qual
parece dirigir-se a parábola deste domingo. Humanizar é reconciliar-se com a
própria sombra.
Muitas
vezes vivemos apenas um polo e recalcamos o outro. Enquanto este
permanecer nas sombras terá um efeito destrutivo. Muitos ficam chocados quando,
apesar de todo esforço para serem pessoas amáveis e gentis, descobrem em si
lados insensíveis, antipáticos e ofensivos.
Outro aspecto que aparece na parábola é querer
logo arrancar o joio. Não toleram que o bem e o mal estejam misturados. Esta
tendência costuma desembocar na intolerância e no fanatismo.
Enquanto vivermos, o joio crescerá no
campo do nosso interior. Conviver com
isso nos faz mais humildes e nos protege de uma dureza falsa em relação a
nós mesmos e aos outros.
Jesus
não nos pede que sejamos só trigo – essa é a armadilha de toda
espiritualidade farisaica - , mas que aceitemos
nossa verdade completa e nos reconciliemos também com o “nosso lado
obscuro”
Há muitas pessoas que, não só se sentem
capacitadas senão que, além disso, estão empenhadas em arrancar o quanto antes
o que elas pensam que é a erva má. São
os intolerantes. Não respeitam o pluralismo, nem a diversidade. Exigem que
todos lhes respeite, mas eles se consideram com direito a não respeitar o
dissidente, o diferente ou simplesmente o outro.
O
Senhor não tolera que ninguém se constitua em juiz e que, como
consequência, vai pela vida arrancando tudo o que a ele lhe parece joio. Porque
pode equivocar-se. A religião não tem nem autoridade nem competência para
decidir o que é joio na sociedade. Somente
o Senhor pode saber quem é trigo e quem é joio.
Sejamos tolerantes e respeitosos. Não
julguemos, não condenemos e deixemos a Deus ser Deus. Nós não somos “deuses”.
O caminho do seguimento de Jesus não
visa nos transformar em pessoas perfeitas e impecáveis. Antes, deseja encorajar-nos
a conviver com nosso lado sombrio. O
seguimento de Jesus, portanto, não é combate visando eliminar o joio, mas abrir espaço para que o Semeador atue com
sua Graça.
Só que Jesus não promove a reconciliação do joio e trigo, é só seguir na leitura do evangelho que o próprio Jesus explica o destino da colheita do joio e trigo.
ResponderExcluirMateus 13, 37-43 " Jesus respondeu: " o que semeia a boa semente é o Filho do Homem. O campo é o mundo. A boa semente são os Filhos do Reino. O joio são os filhos do Maligno. O inimigo que o semeia é o demônio. A colheita é o fim do mundo. Os ceifadores são os anjos. E assim como se RECOLHE O JOIO PARA JOGÁ-LO NO FOGO, assim será no fim do mundo. O Filho do Homem enviará seus anjos, que retirarão seu Reino todos os escândalos e todos os que fazem o mal e os lançarão na fornalha ardente, onde haverá choro e ranger de dentes. Então, no Reino de seu Pai, os justos resplandecerão como o sol. AQUELE QUE TEM OUVIDOS, OUÇA"
Grata por tão significativo texto.
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