Quando comecei a ser um perfeito imbecil?... (cf. L. Guerriero)


Li, e gostei porque tem muito a ver com a nossa vida. Confira, e depois comente:

Passe um bom tempo no supermercado. Empenhe-se. Você nem sempre vai às compras, por isso dedique-se com entusiasmo
Olhe a lista que fizeram juntos: farinha, ovos, café. Quando não encontrar o que está procurando – aquilo que figura na lista com todo detalhe: marca, quantidade – pergunte a si mesmo: “O que ela compraria?”. Escolha de acordo. 
Depois de um tempo, verifique se está faltando algo e dirija-se ao caixa. Pague. Caminhe até sua casa com orgulho, as sacolas pendendo dos braços potentes. Sinta-se como um caçador-coletor que retorna à caverna com a presa no ombro. Ao chegar, anuncie: “Cheguei!”. 
Veja-a se aproximar caminhando pelo corredor, com aquela atitude que tem nos últimos tempos, como se se sentisse incomodada, irritada com algo que você não consegue saber o que é. 
Ponha as sacolas na mesa e comece a tirar a mercadoria. Diga: “Aqui estão o chá, a farinha...” Ouça-a dizer: “Essa não é a farinha que te pedi!...”. Diga: “Não tinha, mas trouxe esta que parecia igual...” Ouça-a dizer: “Não é igual. É mais grossa!” Sinta, dentro de você, uma comichão, um misto de tristeza e raiva. Diga: “Tudo bem, vou trocar.” Ouça-a dizer: “Não precisa ir lá só para trocar um pacote de farinha. Vamos usar em alguma coisa...” Não responda.
Veja no rosto dela aquela expressão que te causa medo e alarme: um gesto rígido de reprovação muda, como se todo o seu ser estivesse lhe dizendo: “Não se pode confiar em você, não faz nada direito...” 
Lembre-se como, até recentemente, você era seu herói: como ela acreditava que você era capaz de consertar tudo: um cano quebrado, a falta de dinheiro, e até o clima. Diga: “Trouxe mirtilos.” Ouça-a dizer, já de costas, afastando-se pelo corredor: “Tudo bem. Você gosta.” Pergunte-se como, por quê, e em que momento você começou a ser, para ela, um perfeito imbecil.

Isso tem a ver com a sua vida?


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