1. «A paz esteja nesta casa!» Jesus, ao enviar em missão os seus discípulos, disse-lhes: Em qualquer casa em que entrardes, dizei primeiro: “A paz esteja nesta casa!” (Lc10, 5-6). Oferecer a paz está no coração da missão dos discípulos de Cristo. A «casa», de que fala Jesus, é cada família, cada comunidade, cada país, cada continente... cada pessoa, sem distinção nem discriminação alguma.
Eis, pois, os meus votos no início do novo ano: «A paz esteja nesta casa!»
2. O desafio da boa política.A paz parece-se com a esperança; é como uma flor frágil. Como sabemos, a busca do poder a todo o custo leva a abusos e injustiças.A política é um meio fundamental para construir a cidadania, mas, quando aqueles que a exercem não a vivem como serviço, pode tornar-se instrumento de opressão, marginalização e até destruição.
A função e a responsabilidade política constituem um desafio para todos aqueles que recebem o mandato de servir o seu país e proteger as pessoas que habitam nele. Se for realmente implementada pode tornar-se verdadeiramente uma forma eminente de caridade.
3. Uma política ao serviço dos direitos humanos e da paz. O Papa Bento XVI recordava que «todo o cristão é chamado a esta caridade, conforme a sua vocação e segundo as possibilidades que tem de incidência na pólis. A ação do homem sobre a terra, quando é inspirada e sustentada pela caridade, contribui para a edificação daquela cidade universal de Deus. Uma boa ação política: justiça, equidade, respeito mútuo, sinceridade, honestidade, fidelidade.
Vale a pena recordar as «bem-aventuranças do político», propostas por uma testemunha fiel do Evangelho, o Cardeal vietnamita Van Thuan, falecido em 2002:
Bem-aventurado o político que tem uma alta noção e uma profunda consciência do seu papel e de cuja pessoa irradia a credibilidade.
Bem-aventurado o político que trabalha para o bem comum e não para os próprios interesses, e permanece fielmente coerente.
Bem-aventurado o político que realiza a unidade e está comprometido na realização duma mudança radical.
Bem-aventurado o político que sabe escutar, e que não tem medo de fazer o bem.
Duma coisa temos a certeza: a boa política está ao serviço da paz, e respeita e promove os direitos humanos.
4. Os vícios da política. Não faltam infelizmente os vícios devidos quer à inépcia pessoal quer às distorções nas instituições. Os vícios da vida política tiram credibilidade aos sistemas dentro dos quais ela se realiza. Estes vícios são a vergonha da vida pública e colocam em perigo a paz social:corrupção, negação do direito, falta de respeito pelas regras comunitárias, enriquecimento ilegal, justificação do poder pela força, tendência a perpetuar-se no poder, xenofobia e racismo, exploração ilimitada dos recursos naturais, desprezo daqueles que foram forçados ao exílio.
5. A boa política promove a participação dos jovens e a confiança no outro. Quando o exercício do poder político visa apenas salvaguardar os interesses de certos indivíduos privilegiados, o futuro fica comprometidoe os jovens podem ser tentados pela desconfiança, por se verem condenados a permanecer à margem da sociedade. Pelo contrário, quando a política se traduz no encorajamento dos talentos juvenis e das vocações que requerem a sua realização, a paz propaga-se nas consciências e nos rostos. A política é a favor da paz, e se se expressa no reconhecimento dos carismas e capacidades de cada pessoa.
Cada um pode contribuir com a própria pedra para a construção da casa comum. Nestes tempos, em particular, vivemos num clima de desconfiança que está enraizada no medo do outro ou do forasteiro, na ansiedade pela perda das próprias vantagens, e manifesta-se também, infelizmente, a nível político mediante atitudes de fechamento ou nacionalismos que colocam em questão aquela fraternidade de que o nosso mundo globalizado tanto precisa. As nossas sociedades necessitam de «artesãos da paz» que possam ser autênticos mensageiros e testemunhas de Deus Pai, que quer o bem e a felicidade da família humana.
6. Não à guerra nem à estratégia do medo.A paz não pode jamais reduzir-se ao mero equilíbrio das forças e do medo. Manter o outro sob ameaça significa reduzi-lo ao estado de objeto e negar a sua dignidade. A proliferação descontrolada das armas são contrárias à moral e à busca duma verdadeira concórdia. O terror exercido sobre as pessoas mais vulneráveis contribui para o exílio de populações inteiras à procura duma terra de paz. Não são sustentáveis os discursos políticos que tendem a acusar os migrantes de todos os males e a privar os pobres da esperança. Ao contrário, deve-se reafirmar que a paz se baseia no respeito por toda a pessoa, independentemente da sua história, no respeito pelo direito e o bem comum, pela criação que nos foi confiada e pela riqueza moral transmitida pelas gerações passadas.
O testemunho daqueles que trabalham para defender a dignidade e o respeito das crianças é extremamente precioso para o futuro da humanidade.
7. Um grande projeto de paz. «Quando numa pessoa surge a consciência dos próprios direitos, nela nascerá forçosamente a consciência do dever... (João XXIII). A paz é fruto dum grande projeto político, que se baseia na responsabilidade mútua e na interdependência dos seres humanos. A paz é uma conversão do coração e da alma, sendo fácil reconhecer três dimensões indissociáveis desta paz interior e comunitária:
- a paz consigo mesmo, rejeitando a intransigência, a ira e a impaciência;
- a paz com o outro:o familiar, o amigo, o estrangeiro, o pobre, o atribulado..., tendo a ousadia do encontro, para ouvir a mensagem que traz consigo;
- a paz com a criação, descobrindo a grandeza do dom de Deus e a parte de responsabilidade que compete a cada um de nós.
A política da paz, que conhece bem as fragilidades humanas e delas se ocupa, pode sempre inspirar-se ao espírito do Magnificat que Maria, Mãe de Cristo Salvador e Rainha da Paz, canta em nome de todos os homens: A «misericórdia [do Todo-Poderoso] estende-se de geração em geração sobre aqueles que O temem. Manifestou o poder do seu braço e dispersou os soberbos. Derrubou os poderosos de seus tronos e exaltou os humildes (...), lembrado da sua misericórdia, como tinha prometido a nossos pais, a Abraão e à sua descendência, para sempre» (Lc1, 50-55).
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