Santo Inácio de Loyola: as marcas da família...


Ninguém é uma ilha. O código genético recebido dos pais e as marcas deixadas pelos nossos antepassados ficam impregnadas no nosso DNA. E nos condicionam de alguma forma. Em toda biografia é mais interessante a sintonia espiritual e afetiva que temos do que as coincidências cronológicas, a não ser que sejam lidas como “teo-incidências”: experiências marcantes e positivas de uma caminhada.
            
O velho brasão heráldico dos Oñaz e Loyola, bem exposto na entrada principal da casa com dois lobos(= López!), simboliza ousadia, agressividade e poder dessa família. Eles, como lobos vorazes, eram capazes de entrar até no mais íntimo dos lares vizinhos para roubar a comida que, com tanto trabalho, as pessoas conseguiram. Íñigo não só nasceu numa família violenta como também viveu num mundo isolado da sociedade urbana. Vivia fechado, não tanto pelo espaço geográfico mas pela distância imposta pela sua linhagem. Os Loyola não tinham título de nobreza, mas pertenciam às famílias poderosas daquele lugar.

Entre as famílias Oñaz e Loyola havia uma rivalidade temerária que se traduzia em grupos opostos: os oñacinos e os gamboínos. Essa intriga levou quase a uma guerra civil e a graves e inumeráveis violências físicas. O poder central do Reis Católicos (Fernando e Isabel) teve que entrar nessa disputa para diminuir a rivalidade. O avô de Íñigo foi castigado com o exílio da sua terra e casa enquanto essa perdia também suas defesas, pois o piso superior de pedra foi demolido.

Pouco conhecemos da família de Ínhigo López de Loyola. De sua mãe, Íñigo nunca disse nada. Morreu no parto? Pouco depois? Sabemos que dona Marina teve 13 filhos e Íñigo foi o caçula. Sua ama-de-leite, Maria Garín, afirmou, com certeza e energicamente, no processo de beatificação e contra o parecer de toda a Companhia nascente (e até do próprio Inácio na sua Autobiografia), que o “pai Inácio tinha alguns anos a mais de quantos ele mesmo cria ter”E parece que ela tinha razão. 

A morte prematura de D. Marina pertence às raízes escondidas da personalidade de Íñigo. A falta da mãe nos primeiros anos da vida, implica na privação de certas experiências e funções: proteção, liberdade, ordem, segurança... É a mãe quem transmite modelos e inspira confiança; sua ausência pode provocar, dizem os estudiosos, insuficiente crescimento corporal, e sabemos que Ínhigo, contrariando a média de altura dos bascos, era de baixa estatura: 1,58m. de altura. Um padre cisterciense o chamou carinhosamente, numa homilia de "homenzinho de Deus". 

A figura materna foi suprida, positivamente, por outras figuras femininas: a da mãe de leite, a da sua ótima cunhada Madalena de Araóz. E depois, por aquelas outras piedosas mulheres que mais tarde conhecerá em Manresa e Barcelona. A uma delas ele chamará, afetuosamente, de "mãe".

Que eu saiba, Ínhigo não conheceu os avós, e seu pai, Beltrão, morreu quando ele tinha apenas 16 anos de idade.    

Outro traço marcante da psicologia de Ínhigo foi o fato de ser o caçula. Desde a data de casamento dos pais até o seu nascimento, passaram-se 24 anos e nasceram 12 irmãos. O primogênito geralmente absorve a insegurança dos pais e o caçula o cansaço do trabalho e dos anos.

Os irmãos de Ínhigo? João, o primogênito e Beltrão, o terceiro, morreram guerreando em Nápoles (1496). Hernando veio para América fazer dinheiro e aqui desapareceu... Pedro tornou-se sacerdote da paróquia de Azpeitia e, contudo, tinha duas filhas. Suas irmãs? Juaniza, Madalena, Petronila e Sancha... O pai deixou, também, dois filhos bastardos. 

Quando o corregedor da Província quis processar Ínhigo e seu irmão padre "por delitos enormes..." acontecidos nos dias de Carnaval do ano de 1515, ele fugiu para Loyola e invocou sua condição de "clérigo". Apelou ao tribunal eclesiástico para escapar da justiça ordinária, mas o corregedor não se deu por vencido e manteve sua acusação afirmando que o jovem Ínhigo de Loyola jamais usara veste de clérigo e, pelo contrário, andava frequentemente armado, tinha os cabelos cumpridos, vestia roupas vistosas e um gorro vermelho típico do bando dele. A "tonsura clerical" recebida prematuramente um dia, era uma forma de manter privilégios indevidos numa sociedade onde a maioria das pessoas carecia deles.

Seu pai, certamente, ficou satisfeito quando viu partir Ínhigo para o palácio real de Arévalo. Viveria com a família do ministro do Tesouro Real João Velázquez de Cuéllarcasado com Dona Maria de Velasco, parente dos Loyola. Lá poderia ganhar fama e dinheiro. Inhigo passará, pois, os anos da sua juventude (1506-1517), no meio do luxo e da vaidade da corte do Rei da Espanha, até se fazer homem.      

Quais os valores que Ínhigo assimilou nessa sua família? O ambiente era naturalmente cristão, com as típicas sombras da época. 

Uma coisa é certa: Ínhigo de Loyola não nasceu santo, nem no seio de uma família santa.



Um comentário:

  1. Bom lembrar que o Santo nem nasceu santo nem numa família santa... assim, "Deus prepara os escolhidos, não escolhe os preparados". (S.V.HOLTZ)

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