... pois todos vivem para Ele (Lc 38)
Estamos nos aproximando do final do ano litúrgico. Depois de um longo percurso fazendo caminho com Jesus, chegamos a Jerusalém. Continua a polêmica com os dirigentes religiosos. Os saduceus entram em cena; eles constituíam a elite econômica, social e religiosa da sociedade judaica. Eram colaboracionistas dos romanos, para não colocar em risco seus interesses. Só admitiam o Pentateuco e não acreditavam na ressurreição. Um grupo deles se aproxima de Jesus, ironizando o tema da ressurreição: vários irmãos que de acordo com a lei do levirato, casam-se com a mesma mulher; de quem vai ser a mulher?
Jesus não responde diretamente à pergunta absurda rejeitando a ideia infantil dos saduceus que imaginavam a vida dos ressuscitados como prolongamento desta vida, e tira uma conclusão decisiva para nossa fé: “Deus não é Deus dos mortos, mas dos vivos, pois todos vivem para Ele”. A ressurreição não é um retorno ao passado, mas é a entrada em uma outra vida. Ressuscitar não é voltar a ser como antes.
A experiência da ressurreição consiste numa Nova Criação. Deus é fonte inesgotável de Vida e acolhe a todos em seu amor de Pai-Mãe. Há uma diferença radical entre nossa vida terrestre e a vida plena, depois da morte. É Vida absolutamente “nova”.
Nós somos destinados, portanto, não à morte, mas à Vida e essa Vida já começou. Somos Vida. Vida transformada no seio da Vida que se faz vida em nós. Vivemos no fluxo da única Vida que vive em nós. Somos a Vida, ou mais precisamente, Ela é em nós. O Divino em nós ativa todas as possibilidades de nossa vida, conduzindo-nos ao seio da única Vida.
Crer no Deus que é Vida, implica ser militante em favor da vida, frente a uma cultura de morte e violência. E crer na vida é rebelar-se contra todos os poderes que a asfixiam, e são vítimas da “cultura do descarte”: migrantes indígenas, mulheres marginalizadas, crianças e idosos abandonados...
Com frequência, muitos estabelecem uma separação entre Deus e vida, parecem realidades contrapostas. Alguns veem a vida com suas limitações e contradições como uma dificuldade para acreditar em um Deus bom e misericordioso. E outros, pelo contrário, veem Deus como um empecilho para desfrutar a vida em toda sua plenitude. Eles têm uma imagem negativa de Deus.
Com isso, a religião e a vida entram em conflito, porque a religião complica a vida de muitas pessoas que levam a sério sua experiência de Deus. E a vida, com seus direitos e instintos é vista como uma ameaça para fazer uma experiência de Deus.
Todos experimentamos as consequências funestas desta confrontação entre Deus e a vida. No entanto, o Evangelho deixa claro que a mediação entre os humanos e Deus é a vida, não a religião. A religião, expressão importante da vida, deve estar sempre a seu serviço. Quando a religião agride avida e a dignidade das pessoas, ela se desnaturaliza e se desumaniza, e acaba sendo uma ofensa ao Deus de Jesus.
Para Jesus, primeiro, é a vida e não a religião. A religião deve estar a serviço da vida, para dignificá-la. Jesus sempre se deixou conduzir para aliviar o sofrimento humano, e levar a Boa Nova aos pobres. A espiritualidade cristã funde a causa de Deus com a causa da vida; encontramos Deus na medida em que defendemos a vida.
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