“Ou estás com inveja porque estou sendo bom?...” (Mt 20,15)
Os textos evangélicos dos três últimos domingos desenvolveram o mesmo tema, numa progressão interessante: o 23º DTC nos falava da correção fraterna, 24º DTC falou da necessidade do perdão contínuo. Hoje nos fala do chamado a trabalhar em favor do Reino, a partir da pura gratuidade.
O evangelho deste domingo é profundamente provocador, pois nos introduz em um mundo de contradição, e faz clamar por um pagamento mais equitativo. O modo de proceder do proprietário da vinha transtorna os esquemas do sistema econômico.
O coração do ser humano é palco de dramas desafiadores, pois lá está a inveja destruidora, dinamismo demolidor que petrifica e enrijece posturas. A inveja acirra os conflitos, envenena as relações, arrasa instituições.
No contexto atual, a inveja é um dos motores sociais mais importantes, pois é considerada alavanca para a competição, e insuflar as pessoas na busca de metas ambiciosas, passando por cima dos outros.
Jesus conhece bem o coração do ser humano; Ele sabe que a inveja compromete a alegria dos seus seguidores e incrementa silenciosamente a incompetência para a fraternidade. A inveja é mãe de muitos filhos, e tem um poder de ramificação incrível, dando margem às intrigas em todos os ambientes. A inveja, diferentemente de outros pecados capitais (luxúria, gula e soberba...), não proporciona prazer. Trata-se de um drama que tira o sabor de viver.
Na parábola deste domingo, Jesus não tem a intenção pedagógica de abordar a temática da justiça social que poderia aparecer na queixa daqueles que foram os primeiros contratados pelo dono da vinha. Estes, vendo o quanto tinham recebido aqueles que tinham sido contratados no fim do dia (uma moeda de prata), alimentaram desejos nos seus corações de receberem mais. O incômodo nasceu da generosidade do dono da vinha. Seus critérios não comprometem a justiça, pois uma moeda era o justo para um dia de trabalho.
Quando a moeda é referência, símbolo do valor que se dá a si mesmo, a inveja é consequência inevitável e terrível. O trabalhador não é capaz de viver a alegria de ter sido chamado, mesmo na primeira hora e, sobretudo, a alegria de ter realizado o serviço e o cuidado que fizeram com que a vinha florescesse. A mesquinhez faz centrar o valor no próprio reconhecimento. Esse caminho não leva a nada, cria aflições, multiplica os incômodos da competição, e no final, só resta o gosto amargo da insatisfação. O valor está no serviço, ensina o Mestre. O ganho é o serviço que se realiza. Importante é a vinha. Dignificante é ser contratado por seu proprietário para trabalhar nela. A grandeza de ser chamado e a nobreza do “sim” é o remédio contra a inveja.
Na vinha do Senhor, a fecundidade é resultado da consciência da honra de ser chamado por Ele, não importando o tempo e menos ainda o valor monetário ou a busca de reconhecimento do serviço realizado. Gratuidade e generosidade são as atitudes do coração, marcas de quem trabalha nessa vinha do Reino. Tais atitudes garantem a liberdade que o coração humano procura. O decisivo é a participação honesta e oblativa naquilo que realiza.
Trabalhar, servindo com a consciência despojada de simples servo, é a indicação que Jesus dá aos seus para encontrar o caminho da fecundidade, a superação das amargas queixas, o risco de afogar-se nas próprias inferioridades. Os olhos precisam estar sempre fitos no Senhor da vinha, fazendo o que Ele indicar, com alegria e investimento de todo o ser. Essa é a verdadeira recompensa, o “denário” do final do dia.
Hoje precisamos superar todo espírito de competição, cobiça e “exclusivismo” que pulsa no subconsciente cristão. É ainda latente uma atitude de complexo de superioridade que não tem nenhuma justificação.
Não resta dúvida que aceitar em profundidade a mensagem evangélica de hoje de que “os primeiros serão os últimos”, exige de nós uma mudança de mentalidade a fundo.
A parábola pretende criar relações humanas que estejam além de todo interesse egoísta. Os atos dos Apóstolos nos dão a pista quando nos dizem: “possuíam tudo em comum, e repartiam os bens entre todos, segundo a necessidade de cada um”.
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