A grande originalidade da história e da vida de santo Inácio de Loyola é a que aconteceu dentro dele mesmo. Sua principal contribuição à história da humanidade não é o que pessoalmente ele realizou, mas a descoberta de seu “mundo interior”, do coração, onde acontece o mais importante e decisivo de cada pessoa.
O tempo de sua convalescença na Cassa-Torre do seu irmão, foi a mediação histórica de que Deus se valeu para irromper na vida daquele homem. tudo começou com a leitura de alguns livros (“Vita Christi” e “Legenda Áurea”). Foi, para ele, a primeira porta de acesso ao Mistério de Deus que até agora pouco valorizara:
“Como era muito dado a ler livros mundanos e falsos, que costumam chamar de cavalarias, sentindo-se melhor, pediu que lhe arranjassem alguns deles para passar o tempo. Mas naquela casa não se encontrou nenhum dos que costumava ler. Deram-lhe então uma Vita Christi (Vida de Cristo) e um livro da vida dos Santos romanceado. Lendo-os muitas vezes, ia-se afeiçoando lentamente ao que ali estava escrito. Mas, deixando-os de ler, algumas vezes parava a pensar no que havia lido” (Aut. 5 e 6)
Da “leitura dos livros” passou à “leitura de si mesmo”: este é o primeiro deslocamento que Inácio experimentou em seu interior.
Inicia-se uma travessia do “texto escrito” ao “texto da vida”. Leitura provocativa e questio-nadora, pois ela desmonta uma estrutura fincada em falsos fundamentos e desperta o desejo de construir a vida sobre uma nova base. Leitura conflituosa, marcada por resistências e medos, mas, ao mesmo tempo centrada, com pausas para reflexão sobre as reações que ela despertava nele.
Imobilizado e impossibilitado fisicamente pela perna ferida na batalha de Pamplona (1521), Inácio se surpreende a si mesmo escavando e trazendo à tona toda sua capacidade de aventura neste continente inexplorado (o de seu mundo interior). Enquanto seus contemporâneos aventuravam-se na descoberta de novas terras, seu descobrimento não é menos importante nem de menor alcance que o daqueles. Sem ruído, sem galeões, sem dinheiro, sem pólvora, sem armas, sem sangue, sem violência, sem vencidos e humilhados, Inácio abrirá caminhos nesse continente interior, próprio e de cada ser humano.
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