3ºTP: A Ressurreição revela a força transformadora nos fracassos... (cf. A. Palaoro SJ)

... entraram na barca, mas não pescaram nada naquela noite... (Jo 21,3)

 


A vida é constituída de momentos de vitórias e de derrotas. Este é o material com o qual são construídas nossas histórias, pessoais e coletivas.

Todos já vivemos experiências de fracassos, quando tudo desmorona, quando perdemos o chão e parece que evapora tudo sobre o qual tínhamos investido o nosso amor e toda a nossa energia.

No horizonte da Ressurreição, o fracasso tem seu lugar. Ele pode ser percebido como chance para crescimento ou amadurecimento, ou pode ser integrado à luz de outras experiências positivas. Aprendemos mais pelos nossos fracassos do que pelos nossos êxitos.

 

O fracasso pode ser, à luz da Ressurreição, desvelador da natureza do ser humano, que vai amadurecendo, superando o sentimento infantil de onipotência, descendo do pedestal de sua soberba para tornar-se mais humano, mais amoroso, mais confiante... Os fracassos podem se revelar como ocasião privilegiada para ativar outros recursos que não tiveram chance de se expressarem.

 

Integrar os fracassos significa assumir as perdas ou carências que aparecem como uma negação de vida, mas que contém potencial de nova vida, de crescimento, de maturação pessoal. 

 

Em nosso contexto social, o fracasso é vivido como uma perda de prestígio e poder. Mas se o situamos no horizonte da Ressurreição, pode ser elaborado saudavelmente e, então, poderemos descobrir que o fracasso pode ser fonte de fecundidade. A Ressurreição nos ajuda a re-siginificar, a re-ler, a re-interpretar todos os nossos dramas, crises, feridas e fracassos... 

 

Há um relato que sempre nos impacta muito e que aparece no capítulo 21 do evangelho de João. Trata-se da aparição do Ressuscitado aos discípulos no lago da Galileia.

 

Normalmente nosso imaginário concebe a Ressurreição como uma grande “apoteose”; mas, se algo está ausente nas aparições do Ressuscitado, é precisamente a apoteose.

 

Ao relatar como o Ressuscitado se conectava com os seus amigos e amigas, o que nos assombra é sua discreta maneira de fazer-se próximo, de surpreender-lhes em seus trajetos habituais, de lhes saudar com o “Shalon” de cada dia, de apresentar-se sob as aparências mais comuns: um trabalhador de parques e jardins, um forasteiro desinformado a quem é preciso atualizá-lo sobre os últimos acontecimentos, um desconhecido ocioso que, a partir da margem do lago, pergunta como foi a pescaria.

 

Mas há um dado constante nos relatos das Aparições do Ressuscitado: Ele se faz presente no meio do fracasso, da dor, da tristeza, da ferida... e, aos poucos, vai iluminando a situação dramática de cada pessoa ou do grupo, vai reconstruindo vidas despedaçadas, vai abrindo horizonte de sentido e confirmando a missão de prolongar o “movimento de vida” iniciado na Galileia.

 

No relato deste domingo, o evangelista João revela que, à primeira vista, parece que a situação dos discípulos não tinha mudado; eles tinham perdido sua condição de seguidorestocaram fundo na decepção e atrofiaram o sonho no qual acreditavam estar fundadas suas vidas. 

Novamente eles se encontram junto à praia e entre redes, como no começo; o vazio, o abandono, a solidão, a escuridão da noite, a rotina de um trabalho cansativo e ineficaz, dominam a paisagem do texto; novamente a dureza de cada dia, em um cotidiano sem a presença de Jesus. 

 

Mas, um “estranho”, muito cedo, da margem do lago, atreve-se a provocá-los, fazendo uma pergunta onde mais doía: moços, tendes alguma coisa para comer?

 

Diante de um “não” ríspido, o Ressuscitado faz um convite ousado: “Lançai a rede à direita da barca e achareis”. É como se dissesse: mudem de atitude, pesquem de maneira diferente, busquem outros lugares, saiam da rotina, sejam criativos... Também para lançar a rede existem dois lados: um lado conhecido e rotineiro; e outro lado alternativo e novo. Revendo o passado, os discípulos reconheceram que estavam trabalhando no lado errado, determinados pela mesmice de sempre. 

 

Saber escutar os outros sempre pode ser útil. O pior é a auto-suficiência que leva a acreditar que sabe tudo. Até o conselho de um desconhecido pode ser princípio do êxito.

 

Há algumas brasas, que recordam aquela fogueira em torno da qual, alguns dias antes, o velho pescador jurou não conhecer Jesus, negando-o três vezes. Agora, junto ao fogo irmão, Jesus lavará com misericórdia a fraqueza de Pedro, transformando para sempre seu barro frágil em pedra fiel.

 

É do meio do fracasso que pode brotar o impulso para uma adesão mais radical Àquele que no fracasso “desceu” ao mais “inferior” (“infernos”) da condição humana, Àquele que “se fez fracasso” para se fazer mais solidário com todos os fracassados da história.

 

Assim aconteceu com Pedro e os seus companheiros. Foi no contexto do fracasso (morte de Jesus, retorno à profissão de pescadores, pescaria infrutífera...) que Pedro foi perguntado três vezes sobre o “amor”.

 

Foi também nesse contexto que Pedro teve chance de se deixar reconstruir em sua identidade pela presença do Ressuscitado; também por três vezes expressa a radicalidade de seu amor à pessoa de Jesus Cristo, que se faz visível na identificação com Ele e na confirmação de sua missão: apascenta minhas ovelhas”.

 

As perguntas de Jesus a Pedro nos revelam que a cura das feridas emocionais é, antes de tudo, um caminho novo que envolve afeto, amizade, amor

 

Antes, um Pedro valente o suficiente para cortar a orelha do servo do Sumo Sacerdote com a espada, mas que perde a valentia em seguida, a ponto de negar conhecer o próprio Jesus.

 

O Pedro que emerge deste contato terapêutico com o Ressuscitado é um Pedro corajoso, decidido, mas também muito mais amoroso, humano, pronto para exercer o “ministério do cuidado” do rebanho, confiado pelo Ressuscitado.

 

 

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