Mas um samaritano que estava viajando, chegou perto dele, viu e sentiu compaixão... (Lc 10, 33)
O cristão é um pobre que ama e cuida de outros pobres, um ferido que se faz presente junto a outros feridos. Há um ponto de partida comum: a experiência da pobreza radical de todos que se encontram.
Somos seres de relação; é a nossa essência. Definimo-nos pela maneira como nos fazemos próximos junto aos outros. Há presenças impositivas, indiferentes, manipuladoras e geradoras de conflitos. E há presenças “cristificadas”, carregadas de compaixão.
Uma das páginas mais belas e provocativas do Evangelho é a parábola do “bom samaritano. Nesta parábola, Jesus destaca uma imagem que deve inspirar uma presença comprometida de todo seguidor seu.
O relato começa com uma situação dramática: um homem “ferido de morte” à beira de um caminho. Várias pessoas passam por ele: um sacerdote, “ponte” entre os homens e Deus, e um levita, dedicado ao serviço do Templo. São incapazes de atendê-lo. Dão meia-volta e se vão.
O encontro com Deus no templo não os movia à comunhão com o semelhante em extrema necessidade. Fugir do sofrimento é, certamente, quase um ato reflexo em todos nós. Mas o samaritano, pelo contrário, se deteve, talvez porque sabia o que era ser desprezado. A experiência da própria dor desperta nele uma grande sensibilidade, e o anima a “inclinar-se”, de maneira quase “natural”, para o mais necessitado. A redação de Lucas reforça insistentemente os verbos “viu”, “sentiu compaixão” e “cuidou dele”. O samaritano ficou “afetado” ao contemplar o drama do outro.
A sequência na maneira de agir do samaritano é preciosa e fica perfeitamente refletida na narração através dos verbos: olhar, aproximar-se, enfaixar as feridas, colocar o ferido sobre sua cavalgadura, levar, cuidar, retornar. Uma progressiva implicação que termina alterando seu caminho e sua vida. Seus planos foram mudados.
Mas, não basta o olhar; é preciso a “conversão das mãos”. O samaritano conta com a ajuda do dono da hospedaria. Este se torna na solidariedade quando aceita fazer o que lhe fora pedido. Ele prolonga os gestos humanizadores do samaritano...
Depois de apresentada a situação concreta, através de uma parábola, Jesus relança a questão para o mestre da lei: “qual dos três foi o próximo do homem que caiu nas mãos dos assaltantes?” A resposta brota límpida: não é possível escolher o próximo.
Quem é capaz de romper esquemas e se transformar em servidor, com total generosidade, faz a experiên-cia de “próximo”, no sentido do discipulado cristão.
Por conseguinte, “próximo” tem um sentido bem preciso. É o outro necessitado de ajuda. Por outro lado, só quem tem uma correta imagem de Deus, terá uma correta imagem de próximo. A indiferença do sacerdote e do levita deveu-se a uma falsa concepção de Deus, separado dos seus prediletos. Já o samaritano foi aquele que possuía uma fé verdadeira, expressa em atitudes de elevado padrão de misericórdia.
O verdadeiro seguimento de Jesus nos faz “virar a cabeça” e dirigir nosso olhar para as “margens”,para as “periferias” da história... comprometendo-nos com os prediletos de Deus. Para Jesus, o centro está nas margens; os marginalizados e excluídos são trazidos por Ele ao centro.
Na perspectiva cristã, a opção pelos pobres não está vinculada a um voluntarismo ascético-moral, mas a um caminho no qual o ser humano se des-vela como pessoa guiada pelo princípio compaixão, sensível ao sofrimento dos outros e feliz por compartilhar seu ser e seus bens com os despossuídos.
É preciso abrir os olhos para ver, e ajudar mais e melhor.
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